domingo, 7 de março de 2021

Brasil: Versão Brasileira – Pigmalião Escultura que Mexe – Transmitido em março/2021

                                             

               Recebi um convite despretensioso para assistir a uma peça de boneco. Um artista me  procurou, dizendo que se lembrava de ter lido sobre um escrito meu sobre uma peça que ele tinha participado e perguntou se eu poderia assistir Brasil: Versão Brasileira, do Grupo Pigmalião Escultura que Mexe. Mal sabia, que estava diante de uma experiência incrível, mesmo com todas as limitações de ver um espetáculo diante de uma tela, emocionante, reflexiva, não um tapa na cara, para acordar, mas uma verdadeira chacoalhada, que nos revolve neste momento que estamos vivendo neste país, que a cada dia tem se tornado pesado e difícil.


               Concebida inicialmente para uma apresentação na França em novembro/2018, a peça se tratava de uma exposição de um bonequeiro expondo as suas contradições de brasileiro a uma plateia francesa. Um latino americano no meio de colonizadores. Em 2021, em plena pandemia, no epicentro, o desafio seria outro, atualizar o espetáculo, apresentando as nossas contradições para nós mesmos, os brasileiros.

                    Como bonequeiro, Eduardo Félix não se apresentaria em carne e osso, mas por meio de um boneco de madeira e fios, que impressiona pela semelhança, expressão, emoção e realidade que transmite as ideias de seu criador e em cima de madeira, como um barco que atravessa o oceano com medo do mar, mas sem medo da madeira sob seus pés, o grupo navega por nossa história, desse estupro gigante que nascemos, nesse país do futuro do pretérito no qual as pessoas sabem o que é ser carvão para queimar e que não se manipulam apenas bonecos, onde dançamos alegres a música mais triste, nos perguntando rindo por fora e chorando por dentro: quando isso tudo vai mudar?

                  A peça traz conceitos históricos baseados em uma vasta bibliografia de autores importantes que se debruçaram a escrever sobre nosso país: Carolina de Jesus, Oswaldo de Andrade, Abdias Nascimento, Eduardo Galeano, Darcy Ribeiro, Milton Santos, Paulo Freire, Silvio Almeida entre outros, além de ser claramente observada, no decorrer da apresentação, uma forte pesquisa historiográfica sobre as mais diversas fontes, para dar voz ao boneco que pergunta quem deveria estar escutando o que ele tem para falar, pergunta complexa neste momento tão estranho que as verdades foram substituídas por opiniões terceirizadas, onde se impedem sem crime, condenam sem provas, executam sem disfarçar: seja por asfixia, fome ou tiro.

             A fotografia, o audiovisual e a trilha sonora da peça simplesmente nos fazem esquecer por algum momento que estamos em casa, em uma tela, assistindo a peça, em um momento mágico, que nos faz lembrar a importância da arte e dos artistas, que dão vida aos sonhos, verdadeiros alquimistas, não nos deixando esquecer quem somos. Espero muito assistir esse espetáculo ao vivo e sentir todas as emoções que ele pode proporcionar.

              Por fim, sugiro um estudo na melhoria da mixagem em alguns momentos, que embora seja uma cara opção a sobreposição de áudio, que funciona muito bem, em outros traz uma pequena confusão. Também sugiro não colocar o curta antes da apresentação, em que pese ser tão especial, pela força da peça, bem como, se possível, ter um making-of ao final.

                Agradecimento: Daniel Ferreira

                Ficha técnica: clique aqui

                Fotos: (https://www.pigmaliao.com/).