Abro um exceção aos textos teatrais do blog, para, com muito prazer, apresentar um trabalho da faculdade, da cadeira de Antropologia Jurídica:
UM ENSAIO ANTROPOLÓGICO SOBRE O PODER EXECUTIVO FEDERAL ATUAL
1. Introdução
O presente tem a intenção de tirar o véu, desnudar à luz da Antropologia Jurídica e da Constituição Federal, as intenções contidas em frases ditas, ao longo dos últimos anos, por pessoas que compõem o atual governo federal. Para tanto, temos como premissa a criação de um liame que una as referidas frases, a bibliografia utilizada, os ensinamentos da disciplina em tela e as ações governamentais, consequência das frases.
Dentre várias opções, este tema foi escolhido pela urgência de entendermos o país que estamos vivendo e o país que podemos deixar para as próximas gerações. Se queremos um país inclusivo, multicultural, menos desigual ou queremos um país exclusivo, que represente uma só cultura e mais desigual? Responda a esta pergunta, antes de prosseguir. Se prosseguir, se esvazie de dogmas e preconceitos e aproveite para refletir.
2. Conceitos Antropológicos
Apresento os conceitos antropológicos que servirão de base reflexiva ao leitor e fundamentarão os argumentos da conclusão.
a) O Homem e a Cultura
Antropologicamente, o Homem não é uma realidade monolítica, ele forma um complexo e sua realidade tem várias dimensões, sendo formado pela Bios (corpo, organismo) e pela Nous (a razão, a capacidade de julgar e fazer escolhas). A junção dessas duas dimensões em uma coletividade tem como resultado a Cultura, sendo o Homem o único ser possuidor disto, sendo a coletividade agente da produção cultural.
Para LARAIA (2001): “O Homem é o resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é um herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquiridas pelas numerosas gerações que o antecederam.”
Fazer essas escolhas gera conflitos, inerentes a qualquer Cultura, que serão resolvidos por acordos culturais. Esses acordos serão instrumentalizados pelo Direito, que tem como finalidade a busca pela Justiça.
Ensina CHAUÍ (2001), por meio da obra hegeliana: “A Cultura representa as relações dos homens com a Natureza pelo desejo e trabalho, pela linguagem, as instituições sociais, o Estado, a religião, a arte, a ciência, a filosofia. É o real enquanto manifestação do Espírito...ele é a Cultura, pois existe encarnado nela.”
A Cultura é o que vai fundamentar uma lei a partir de seu valor, e só se constrói a Justiça a partir da Cultura e da práxis (o Direito), sem esta dimensão axiológica e sem esta tríade, não se pode falar em Justo. E o Justo ocorre quando a alma do Homem se realiza, quando nossa existência encontra acolhimento, encontrando assim uma razão para viver. Esta razão é o Justo, um projeto coletivo que aceita o outro, aceita todos, é plural, diverso.
b) Do Teocentrismo ao Antropocentrismo
Para alcançarmos o marco que representa a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que tem como fundamento uma tese antropológica que defende as Culturas, no plural, nossa história passou por outros marcos, como o Tratado de Paz de Vestfália (1648), que reelaborou a dinâmica do poder, criando os Estados; e a Revolução Francesa (1789), que reelaborou a dinâmica do Poder ao deixar claro que o poder só existe na Vontade Geral, um Poder coletivo, representando uma ruptura no Absolutismo. Isso se deu paulatinamente e em ambos os marcos anteriores, o enfraquecimento do monopólio do poder ocorreu por que o Direito e a Justiça passaram a ser diretamente proporcionais à concepção do Homem, que ao abandonar a ideia de teocentrismo, fez com que o Direito passasse a ter uma concepção metafísica e abstrata, o que levou ao fim da concepção religiosa do próprio Direito, embora este carregue influencias canônicas até os dias atuais. Partindo de dois conceitos importantes, componentes da Cultura: o natural (tudo o que não tem a participação humana) e o artificial (o que tem participação humana), observamos que a perpetuação do poder dominante consiste sempre em apresentar, utilizando o Direito e as suas Leis, uma realidade artificial como se fosse natural, como por exemplo acontecia quando era reforçado que o poder de um governante é divino e abençoado por Deus.
Após estas rupturas, com o surgimento do Antropocentrismo, o Homem no Centro, no lugar de Deus, o foco passou a ser a autoridade do Homem. Esta autoridade criou os próprios valores e culturas, alimentando uma revolução dentro do Direito. Assim, o Homem abandonou o mito, o dogmático e a certeza absoluta inexplicada e os trocou pela dúvida da qual precisa buscar explicação, começando, então, a se humanizar, na busca pela dialética, criando um produto da sua história na Terra, o Direito. O mito preencheu um vazio de conhecimento, uma criação derivada do medo do Homem, aos poucos a Teologia substitui o mito, que vai dando lugar ao Homem, até que em 1789, com a Etnologia, o Homem se distancia da natureza, de Deus e da Igreja; e, mesmo aceitando a autoridade religiosa, passou a dar um destino à própria vida, uma racionalidade na qual passa a definir um Sistema Jurídico, saindo do saber transcendental para o saber empírico, passando a fundamentar o Direito. Destaco a diferença de religiosidade, que é uma necessidade natural do Homem, para religião, que é um produto artificial de uma cultura, na qual se estabelece quem é Deus e como cultuá-lo.
O Estado ocidental caminha de forma laica, secular, com foco no Homem, conforme esclarece SACCO (2013): “A partir de certo momento, no mundo ocidental a tomada do poder religioso sobre o poder civil se atenua... A religião tornou-se cada vez menos mágica e cada vez mais ética: fornece critérios de comportamentos aos indivíduos (e, para tanto, obrigar o cidadão a obedecer ao direito. A legitimação sagrada tente a desaparecer ... As revoluções liberais marcam etapas muito importante desse itinerário.”
c) A moral fechada e a moral aberta
Para prosseguirmos na nossa análise, temos que distinguir dois conceitos importantes: a moral fechada (inflexível, estática, com a qual novos valores e atitudes não
penetram na comunidade, prevalecendo o legalismo) e a moral aberta (flexível, dinâmica, que aceita novos valores, na qual prevalece a principiologia).
Observa-se que a moral fechada quer preservar a lei anterior, manter de alguma forma o status quo que lhe convém, já a moral aberta quer incluir novas práticas. Na moral fechada, temos uma recusa à ruptura valorativa por parte do valor do grupo dominante, na moral aberta se admite uma postura de tolerância.
d) Etnocentrismo
Para EVERALDO (1988), “o etnocentrismo implica uma apreensão do “outro” que se reveste de uma forma bastante violenta. Como já vimos, pode colocá-lo como “primitivo”, como “algo a ser destruído”, como “atraso ao desenvolvimento”, (fórmula, aliás, muito comum e de uso geral no etnocídio, na matança dos índios)”, negando assim ao outro a autonomia necessária para o outro existir, se representar e representar a própria cultura. Everaldo também esclarece que “O etnocentrismo está calcado em sentimentos fortes como o reforço da identidade do “eu”. Possui, no caso particular da nossa sociedade ocidental, aliados poderosos. Para uma sociedade que tem poder de vida e morte sobre muitas outras, o etnocentrismo se conjuga com a lógica do progresso, com a ideologia da conquista, com o desejo da riqueza, com a crença num estilo de vida que exclui a diferença.”
Como premissa, registro que os termos maioria e minoria, antropologicamente, se dão em função da quantidade numérica e não da representatividade e que uma cultura não pode ser classificada como superior ou inferior.
O etnocentrismo é o julgamento da realidade do outro através da realidade do Eu. Assim, a realidade é filtrada pelas próprias crenças e convicções, o critério de validade do justo e do injusto é o meu próprio conceito cultural sobre algo. O etnocentrismo pode ser subliminar (brando) ou explicito (violento). É subliminar ou brando quando vem disfarçado de brincadeira, de piada, reduzindo o outro e retirando o poder do outro, é mais ligada ao imaginário coletivo e a vítima, mesmo sendo uma violência de certa forma branda, nem sempre tem ferramentas para reagir. O etnocentrismo será explícito ou violento quando atentar contra a identidade do outro, retirando do outro o direito de ser, negando sua existência, buscando a destruição daquele grupo.
Ressalto que que defender convicções não é etnocentrismo, este ocorre quando transfigura as práticas culturais de um grupo como se fosse a referência única da realidade. Assim, torna-se de fácil visualização o julgamento etnocêntrico: este nega a existência do outro, não reconhece sua existência, o desautoriza.
e) A Constituição e a Cultura, em uma perspectiva antropológica
Se a Constituição não for respeitada, estamos flertando com o etnocentrismo, uma realidade, como já dito, agressiva e perversa, no qual o objetivo é desautorizar o outro. Isto ocorre, por exemplo, quando se utiliza de uma lei para perseguir o outro, utilizando a própria versão unidimensional de Justo. É negação do diferente, é uma visão monolítica da cultura.
Há um dever de reconhecer no outro a mesma dignidade que se tem. Por mais que haja práticas culturais diversas, este dever conduz as leis e nos leva a um processo de identidade. A principal função da Cultura é a criação de uma identidade. Se esta identidade existe, temos o Justo, caso contrário, temos o não Justo, a dominação e a alienação, transformando a vida em violência. Por isso, é necessário respeitar as práticas culturais do outro, sob pena de dano coletivo.
A Cultura para ser assim chamada precisa ser duradoura, coletiva e ter um valor contido, não existe lei que não seja antecedida de um valor. A identidade do Homem é o fundamento da lei, sua cultura é o ponto de partida. Se o sistema jurídico replica a cultura de um povo, temos uma identidade, se não replicar, será autoritário, dominante e violento, pois contempla apenas uma das forças de identidade, aquela que tem acesso ao poder.
A cultura é a síntese da moral e da ética de um povo. Moral é o consenso de práticas que fundamentam uma autorização de uma maneira de se comportar e ética é a capacidade reflexiva de se construir valores, elaborar o necessário para que o valor se realize, sendo essa realização parte da moral. Em suma, o valor é a tentativa da moral de colocar em prática a ideia da ética. Portanto, a Constituição é um pacto ético-moral que, muito mais que um documento jurídico, é a síntese de uma concepção ética de uma perspectiva moral de um grupo humano, é o pacto social, que busca replicar a concepção ética da ação moral justa, sendo este pacto o topo da hierarquia legal e a síntese da concepção ontológica, metafisica, material e espiritual do um povo.
f) Do etnocentrismo cultural ao etnocentrismo jurídico
O Etnocentrismo jurídico se caracteriza quando em determinado espaço, o sistema jurídico privilegia uma etnia em detrimento às demais, criando um sistema jurídico que não é justo, tendo em vista que rompe com o pacto social. Este pacto que nos assegura a equidade. Mas por qual motivo a equidade não chegou à coletividade brasileira? Porque, insistentemente, os atores que detém o poder conseguem criar estratégias que, a revelia do pacto constitucional, vão contra o povo, é a persistência do etnocentrismo cultural.
O desacoplamento entre a identidade um povo e a ordem jurídica acarreta o etnocentrismo jurídico, onde a ordem contempla de forma exclusiva apenas uma parte da cultura de um povo, que prepondera na forma de acesso à lei. Tal fato, pode criar um abismo entre o pacto social (a Constituição) e a realidade.
3. Antropologia na prática
As declarações dos atores políticos Neste tópico serão apresentadas frases e declarações, que estão a mão de qualquer verificação na internet, motivo pelo qual não colocarei a fonte, nem quem as proferiu, relembrando que todas foram proferidas por pessoas que hoje constituem o Governo Federal. O escopo destas declarações está limitado aos itens, não pela importância, mas pela necessidade de não alongar o presente ensaio, tendo em vista que há uma infinidade de declarações que seguem a mesma linha não só neste, mas em diversos outros assuntos, como questão da mulher, questão social, entre outras.
a. Sobre o Estado Laico:
b) Sobre os povos originários:
Embora tenha mais de quatro décadas, em 28/12/1976, iniciarei este tema com a frase proferida por Rangel Reis, Ministro do Interior, retirada do livro: O Genocídio do Negro no Brasil, de Abdias Nascimento - 1978.
c) Sobre a questão dos negros:
d) Sobre orientação sexual e identidade de genêro:
e) Sobre orientação política:
f) Sobre fomento, proteção e difusão da Arte:
4. As consequências concretas das declarações dos atores políticos: As ações governamentais
Neste tópico, apresento uma amostra das ações governamentais que são a face concreta das declarações dos atores políticos, a transformação das frases e ideias em ações, que assim como as declarações não se esgotam por aqui, pelo reduzido espaço do ensaio, e nem por hoje, já que muitas ações oriundas dessas ideias serão, muito provavelmente, ainda implementadas.
a. Sobre o Estado Laico:
O Estado Laico é um conceito do secularismo onde o poder do Estado é oficialmente imparcial em relação às questões religiosas, não se apoiando ou se opondo a qualquer religião. Atualmente, observamos de forma cotidiana diversos ataques ao Estado Laico em discursos oficiais, nomeações políticas condicionadas à religião de matriz cristã e políticas públicas contaminadas por ideias cristãs. Bastando observar a religião dos ministros, por exemplo, muitos sem qualquer capacidade para a coisa pública, indicados de forma obscura como a Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (https://veja.abril.com.br/brasil/damares-deve-lancar-campanha-de-abstinencia-sexual-em-fevereiro/), do atual Ministro da Justiça, um pastor que se diz um servo e chama o presidente de profeta
(https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/04/28/novo-titular-da-justica-e-pastor-e-tem-interlocucao-com-ministrosdo-stf.ghtml) e do atual Chanceler que deixa claro sua posição religiosa que influencia na política externa brasileira . Assim, observa-se ações com cunho religioso como defesa das Igrejas Evangélicas, inclusive com interferência pessoal do presidente junto à Receita Federal para perdão de dívidas (https://exame.abril.com.br/brasil/bolsonaro-manda-receita-perdoar-dividasmilionarias-de-igrejas-evangelicas/)., bem como participação política em diversos encontros
religiosos evangélicos (https://oglobo.globo.com/brasil/coordenador-de-indios-isolados-da-funai-omite-atuacao-em-projeto-missionario-de-evangelizacao-24385866). O Itamaraty tem contrariado a Constituição e pregado a religião como política de Estado. Com seu apoio, parlamentares ligados a igrejas neopentecostais estão ocupando espaços para liderar a agenda do Brasil junto aos países africanos. A iniciativa pretende facilitar a entrada de igrejas e missionários nessas nações. O governo tem dado apoio a missionários para evangelizar indígenas (https://istoe.com.br/afronta-ao-estado-laico/).
b) Sobre os povos originários:
Em relação aos povos autóctones, se observa, conforme citado no tópico 3, uma retomada da política integracionista da Ditadura Militar (https://istoe.com.br/massacrede-indios-pela-ditadura-militar/), buscando uma contínua aculturação, genocídio e extermínio de toda uma cultura. O projeto fica claro no aumento absurdo de desmatamento das florestas (https://g1.globo.com/natureza/noticia/2020/04/13/alertas-de-desmatamento-na-amazonia-crescem-5145percent-noprimeiro-trimestre-mostram-dados-do-inpe.ghtml), na falta de apoio da fiscalização e na punição explícita dos servidores do IBAMA que cumprem o seu papel (https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/04/30/interna-brasil,850174/chefes-do-ibama-queagiram-contra-garimpeiros-sao-exonerados-pelo-gove.shtml), bem como no constante incentivo a grilagem e garimpo em terras indígenas (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/02/bolsonaroassina-projeto-que-autoriza-garimpo-em-terras-indigenas.shtml) e descaso com os povos originários na FUNAI, fundação criada para ajudar a protegê-los, ainda mais visível na pandemia (https://observatorio3setor.org.br/noticias/desamparados-casos-de-covid-19-em-indigenas-crescem-733/ e
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/05/05/funai-diz-que-gestao-pt-era-socialista-e-criticapolitica-marxista.htm).
c) Sobre a questão dos negros:
Aqui continua a política de exclusão sobre a população negra, como se observa na questão quilombola (https://noticias.uol.com.br/colunas/rubens-valente/2020/03/28/governobolsonaro-alcantara-quilombolas.htm), cujas 800 famílias serão removidas após habitarem a mesma região desde o século XVII, para dar lugar a exploração de base militar em parceria com os Estados Unidos da América.
A ingerência da Fundação Palmares com um indicado que atenta contra todos os princípios e objetivos do órgão de proteção à cultura negra
(https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/12/01/Funda%C3%A7%C3%A3o-Palmares-a-nega%C3%A7%C3%A3o-doracismo-e-o-discurso-de-Bolsonaro).
A ausência de notas ou comemoração ao Dia da Consciência Negra também ajuda a mostrar o contexto no qual estamos inseridos (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/11/planalto-ignora-consciencia-negra-e-bolsonaro-se-nega-acomentar-destruicao-de-placa.shtml), bem como a constante embate contra a representatividade do negro no Brasil (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2019/04/26/diversidade-comercial-do-bbtem-mais-negros-do-que-media.htm).
A tentativa de embranquecimento do povo vem inclusive em propagandas governamentais (https://veja.abril.com.br/brasil/gabinete-de-braga-netto-criou-peca-polemica-apenas-comcriancas-brancas/).
Enquanto isso, assistimos ao genocídio do povo negro (https://jornal.usp.br/artigos/reflexoes-em-tempos-de-pandemia-necropolitica-e-genocidios/ e
https://brasil.elpais.com/brasil/2020-01-16/do-genocidio-negro-a-palmitagem-debate-sobre-racismo-se-multiplicae-enfrenta-contradicoes.html), mesmo após 40 anos da denúncia de Abdias Nascimento.
d) Sobre orientação sexual e identidade de genêro:
As ações governamentais sobre este tema seguem o ritmo das ideias. Observamos diversas tentativas de excluir as pessoas, em várias áreas de representatividade como na sáude (https://www.guiagaysaopaulo.com.br/noticias/saude/mandettainvisibilizou-lgbt-e-retrocedeu-em-politica-contra-hiv), na arte (https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2019/08/16/bolsonaro-diz-que-nao-vai-financiar-producoes-com-temas-lgbt-conheca-series-citadas.ghtml e https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2019/11/23/sob-risco-de-censura-e-ataques-de-bolsonarocinema-lgbt-amplia-vozes.htm), na questão da família não heteronormativa (https://observatoriog.bol.uol.com.br/noticias/2019/08/em-evento-bolsonaro-critica-familias-lgbt-e-diz-ideologiade-genero-e-coisa-do-capeta), no genocídio da população trans (http://especiais.correiobraziliense.com.br/brasil-lidera-ranking-mundial-de-assassinatos-de-transexuais), entre outras.
e) Sobre orientação política:
Neste aspecto se observa clara militarização do Governo, negação da Ditadura Militar, revisionismo histórico e perseguição de adversários políticos.
Se observa que este Governo tem mais militares em seus quadros que a própria ditadura (https://brasil.elpais.com/opiniao/2020-02-14/militarizacao-do-governo-bolsonaro-trincheirada-democracia-ou-pressagio-de-ditadura.html)
Além disso, observamos o tratamento dado a figuras como Ulstra (https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/08/08/bolsonaro-chama-coronel-ustra-de-heroi-nacional.ghtml) e Curió (https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/06/mpf-pede-investigacao-de-fabio-wajngarten-porpostagem-sobre-guerrilha-do-araguaia.ghtml), assassinos e torturadores confessos da Ditadura, tratados como heróis nacionais.
A negação da ditadura e o revisionismo histórico são visíveis (https://www.defesa.gov.br/noticias/54245-ordem-do-dia-alusiva-ao-31-de-marco-de-1964).
A perseguição política se dá em diversos meios, em exoneração de quem pensa diferente (https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2019/01/05/interna_politica,1019087/governobolsonaro-ja-exonerou-quase-4-mil-comissionados.shtml) e também por meio virtual (https://diplomatique.org.br/as-milicias-digitais-do-capitao/).
f) Sobre fomento, proteção e difusão da Arte:
Em relação a estes itens se observa a paralisa estatal e a falta de opção para a sociedade, observa-se que diversos editais culturais não saíram do papel e teatros como a Caixa Cultural de Brasília, por exemplo, praticamente pararam de apresentar peças, no contexto pré-pandemia.
Se observa uma política focada em retirar a representatividade das diversas formas de Arte, buscando um pensar único vindo do Planalto (https://artebrasileiros.com.br/cultura/para-juca-ferreira-governo-bolsonaro-decidiu-declarar-guerra-a-arte-e-acultura/).
A extinção do Ministério da Cultura e a sua subordinação ao Ministério do Turismo mostra o descaso (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/11/bolsonaro-extingue-cultura-eesportes-e-deixa-ministerios-de-mulheres-e-direitos-humanos-para-depois.shtml).
5. O que diz a Constituição de 1988, nosso pacto social
Uma lei só poderá ser boa e justa se atender aos interesses coletivos, aí sem será eficaz, caso contrário, representa uma violência. Para termos normas justas, não basta um código jurídico, precisamos do Direito para mediar os conflitos, que sempre irão existir, assegurando a liberdade e identificando a origem destes conflitos, compreendendo se este Direito representa ou não a identidade. Quanto mais representar a cultura no sentido coletivo, mais justo este sistema político será, diferente de uma perspectiva etnocêntrica, na qual o poder atende apenas uma visão do que seja justo.
Tendo isso em mente, apresento dispositivos constitucionais relacionados a garantir uma legislação e um país que atenda os interesses coletivos, lembrando que a nossa Constituição é diretiva, com cláusulas transformadoras, a Constituição cidadã, uma Constituição anti-etnocentrista, fundamentada em teses antropológicas:
6. Conclusão
A nossa Constituição busca, por excelência, a igualdade entre as pessoas, basta ler o seu teor. Entretanto, se a moral não for aberta, o Sistema jurídico não será fruto da coletividade e, assim, não replicará o estudo antropológico completo, tendo em vista que só podemos falar em sistema jurídico se houver uma ruptura com a moral fechada e evoluirmos rumo a uma moral aberta para enfrentarmos o desafio de equalizar as três matrizes que compõem a Cultura: a dos povos originários, a africana e a europeia, e dentro destas, diversas identidades e manifestações culturais. Um só povo para o Direito, mas com as identidades de fato preservadas, já que nenhum sistema legal pode ser contraditório com a sua Cultura, logo, as condutas normativas devem replicar as identidades e replicar a forma de pensar, ser e agir do seu povo.
Entretanto, fica evidente, que nosso cotidiano é marcado pela concentração de poder em uma minoria quantitativa, uma etnia branca hetero-normativa de origem europeia, que nos últimos 20 anos tenta com o imaginário coletivo alimentar o etnocentrismo, sendo contra, entres outras questões, a demarcação de terras indígenas e quilombolas, a política de afirmativa de cotas e o casamento LGBT, se apoiando em ideias oriundas de um regime totalitário e utilizando a religião como fundamento para a Política.
O presente ensaio que teve como objetivo, como dito anteriormente, de desnudar à luz da Antropologia Jurídica e da Constituição Federal, as intenções do atual governo, demonstra, claramente, que estamos de fato em um governo que fomenta a ideia ultrapassada de mito para preencher um vazio, além de professar o fundamentalismos religioso e as ideias de regimes totalitários, militarizados, agressivos e genocidas, que negam a existência do outro em várias dimensões, com o intuito de não permitir a existência de diversas Culturas, rompendo com o previsto no art. 215 da Constituição Federal.
Ficam diversas perguntas e reflexões:
Nosso país está sob a égide de um governo etnocêntrico?
Quantas Culturas podem caber em ideias e ações assim?
Quantas identidades de fato podem se representar?
Você se incomodou com o texto?
Quais as formas de resistir?
Gostaria que respondessem nos comentários do blog.
7. Bibliografia
CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 2 ed., editora Brasiliense, São Paulo
(2001).
EVERARDO, P. Guimarães Rocha. O que é etnocentrismo. 5ª ed., editora Brasiliense, São Paulo (1988).
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: uni conceito antropológico. 14ª ed., editora Zahar, Rio de Janeiro (2001).
SACCO, Rodolfo. Antropologia Jurídica, contribuição para uma macrohistória do Direito. Tradução de Carlo Alberto Dastoli, 1ª ed., editora WMF, São Paulo (2013).
1. Introdução
O presente tem a intenção de tirar o véu, desnudar à luz da Antropologia Jurídica e da Constituição Federal, as intenções contidas em frases ditas, ao longo dos últimos anos, por pessoas que compõem o atual governo federal. Para tanto, temos como premissa a criação de um liame que una as referidas frases, a bibliografia utilizada, os ensinamentos da disciplina em tela e as ações governamentais, consequência das frases.
Dentre várias opções, este tema foi escolhido pela urgência de entendermos o país que estamos vivendo e o país que podemos deixar para as próximas gerações. Se queremos um país inclusivo, multicultural, menos desigual ou queremos um país exclusivo, que represente uma só cultura e mais desigual? Responda a esta pergunta, antes de prosseguir. Se prosseguir, se esvazie de dogmas e preconceitos e aproveite para refletir.
2. Conceitos Antropológicos
Apresento os conceitos antropológicos que servirão de base reflexiva ao leitor e fundamentarão os argumentos da conclusão.
a) O Homem e a Cultura
Antropologicamente, o Homem não é uma realidade monolítica, ele forma um complexo e sua realidade tem várias dimensões, sendo formado pela Bios (corpo, organismo) e pela Nous (a razão, a capacidade de julgar e fazer escolhas). A junção dessas duas dimensões em uma coletividade tem como resultado a Cultura, sendo o Homem o único ser possuidor disto, sendo a coletividade agente da produção cultural.
Para LARAIA (2001): “O Homem é o resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é um herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquiridas pelas numerosas gerações que o antecederam.”
Fazer essas escolhas gera conflitos, inerentes a qualquer Cultura, que serão resolvidos por acordos culturais. Esses acordos serão instrumentalizados pelo Direito, que tem como finalidade a busca pela Justiça.
Ensina CHAUÍ (2001), por meio da obra hegeliana: “A Cultura representa as relações dos homens com a Natureza pelo desejo e trabalho, pela linguagem, as instituições sociais, o Estado, a religião, a arte, a ciência, a filosofia. É o real enquanto manifestação do Espírito...ele é a Cultura, pois existe encarnado nela.”
A Cultura é o que vai fundamentar uma lei a partir de seu valor, e só se constrói a Justiça a partir da Cultura e da práxis (o Direito), sem esta dimensão axiológica e sem esta tríade, não se pode falar em Justo. E o Justo ocorre quando a alma do Homem se realiza, quando nossa existência encontra acolhimento, encontrando assim uma razão para viver. Esta razão é o Justo, um projeto coletivo que aceita o outro, aceita todos, é plural, diverso.
b) Do Teocentrismo ao Antropocentrismo
Para alcançarmos o marco que representa a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que tem como fundamento uma tese antropológica que defende as Culturas, no plural, nossa história passou por outros marcos, como o Tratado de Paz de Vestfália (1648), que reelaborou a dinâmica do poder, criando os Estados; e a Revolução Francesa (1789), que reelaborou a dinâmica do Poder ao deixar claro que o poder só existe na Vontade Geral, um Poder coletivo, representando uma ruptura no Absolutismo. Isso se deu paulatinamente e em ambos os marcos anteriores, o enfraquecimento do monopólio do poder ocorreu por que o Direito e a Justiça passaram a ser diretamente proporcionais à concepção do Homem, que ao abandonar a ideia de teocentrismo, fez com que o Direito passasse a ter uma concepção metafísica e abstrata, o que levou ao fim da concepção religiosa do próprio Direito, embora este carregue influencias canônicas até os dias atuais. Partindo de dois conceitos importantes, componentes da Cultura: o natural (tudo o que não tem a participação humana) e o artificial (o que tem participação humana), observamos que a perpetuação do poder dominante consiste sempre em apresentar, utilizando o Direito e as suas Leis, uma realidade artificial como se fosse natural, como por exemplo acontecia quando era reforçado que o poder de um governante é divino e abençoado por Deus.
Após estas rupturas, com o surgimento do Antropocentrismo, o Homem no Centro, no lugar de Deus, o foco passou a ser a autoridade do Homem. Esta autoridade criou os próprios valores e culturas, alimentando uma revolução dentro do Direito. Assim, o Homem abandonou o mito, o dogmático e a certeza absoluta inexplicada e os trocou pela dúvida da qual precisa buscar explicação, começando, então, a se humanizar, na busca pela dialética, criando um produto da sua história na Terra, o Direito. O mito preencheu um vazio de conhecimento, uma criação derivada do medo do Homem, aos poucos a Teologia substitui o mito, que vai dando lugar ao Homem, até que em 1789, com a Etnologia, o Homem se distancia da natureza, de Deus e da Igreja; e, mesmo aceitando a autoridade religiosa, passou a dar um destino à própria vida, uma racionalidade na qual passa a definir um Sistema Jurídico, saindo do saber transcendental para o saber empírico, passando a fundamentar o Direito. Destaco a diferença de religiosidade, que é uma necessidade natural do Homem, para religião, que é um produto artificial de uma cultura, na qual se estabelece quem é Deus e como cultuá-lo.
O Estado ocidental caminha de forma laica, secular, com foco no Homem, conforme esclarece SACCO (2013): “A partir de certo momento, no mundo ocidental a tomada do poder religioso sobre o poder civil se atenua... A religião tornou-se cada vez menos mágica e cada vez mais ética: fornece critérios de comportamentos aos indivíduos (e, para tanto, obrigar o cidadão a obedecer ao direito. A legitimação sagrada tente a desaparecer ... As revoluções liberais marcam etapas muito importante desse itinerário.”
c) A moral fechada e a moral aberta
Para prosseguirmos na nossa análise, temos que distinguir dois conceitos importantes: a moral fechada (inflexível, estática, com a qual novos valores e atitudes não
penetram na comunidade, prevalecendo o legalismo) e a moral aberta (flexível, dinâmica, que aceita novos valores, na qual prevalece a principiologia).
Observa-se que a moral fechada quer preservar a lei anterior, manter de alguma forma o status quo que lhe convém, já a moral aberta quer incluir novas práticas. Na moral fechada, temos uma recusa à ruptura valorativa por parte do valor do grupo dominante, na moral aberta se admite uma postura de tolerância.
d) Etnocentrismo
Para EVERALDO (1988), “o etnocentrismo implica uma apreensão do “outro” que se reveste de uma forma bastante violenta. Como já vimos, pode colocá-lo como “primitivo”, como “algo a ser destruído”, como “atraso ao desenvolvimento”, (fórmula, aliás, muito comum e de uso geral no etnocídio, na matança dos índios)”, negando assim ao outro a autonomia necessária para o outro existir, se representar e representar a própria cultura. Everaldo também esclarece que “O etnocentrismo está calcado em sentimentos fortes como o reforço da identidade do “eu”. Possui, no caso particular da nossa sociedade ocidental, aliados poderosos. Para uma sociedade que tem poder de vida e morte sobre muitas outras, o etnocentrismo se conjuga com a lógica do progresso, com a ideologia da conquista, com o desejo da riqueza, com a crença num estilo de vida que exclui a diferença.”
Como premissa, registro que os termos maioria e minoria, antropologicamente, se dão em função da quantidade numérica e não da representatividade e que uma cultura não pode ser classificada como superior ou inferior.
O etnocentrismo é o julgamento da realidade do outro através da realidade do Eu. Assim, a realidade é filtrada pelas próprias crenças e convicções, o critério de validade do justo e do injusto é o meu próprio conceito cultural sobre algo. O etnocentrismo pode ser subliminar (brando) ou explicito (violento). É subliminar ou brando quando vem disfarçado de brincadeira, de piada, reduzindo o outro e retirando o poder do outro, é mais ligada ao imaginário coletivo e a vítima, mesmo sendo uma violência de certa forma branda, nem sempre tem ferramentas para reagir. O etnocentrismo será explícito ou violento quando atentar contra a identidade do outro, retirando do outro o direito de ser, negando sua existência, buscando a destruição daquele grupo.
Ressalto que que defender convicções não é etnocentrismo, este ocorre quando transfigura as práticas culturais de um grupo como se fosse a referência única da realidade. Assim, torna-se de fácil visualização o julgamento etnocêntrico: este nega a existência do outro, não reconhece sua existência, o desautoriza.
e) A Constituição e a Cultura, em uma perspectiva antropológica
Se a Constituição não for respeitada, estamos flertando com o etnocentrismo, uma realidade, como já dito, agressiva e perversa, no qual o objetivo é desautorizar o outro. Isto ocorre, por exemplo, quando se utiliza de uma lei para perseguir o outro, utilizando a própria versão unidimensional de Justo. É negação do diferente, é uma visão monolítica da cultura.
Há um dever de reconhecer no outro a mesma dignidade que se tem. Por mais que haja práticas culturais diversas, este dever conduz as leis e nos leva a um processo de identidade. A principal função da Cultura é a criação de uma identidade. Se esta identidade existe, temos o Justo, caso contrário, temos o não Justo, a dominação e a alienação, transformando a vida em violência. Por isso, é necessário respeitar as práticas culturais do outro, sob pena de dano coletivo.
A Cultura para ser assim chamada precisa ser duradoura, coletiva e ter um valor contido, não existe lei que não seja antecedida de um valor. A identidade do Homem é o fundamento da lei, sua cultura é o ponto de partida. Se o sistema jurídico replica a cultura de um povo, temos uma identidade, se não replicar, será autoritário, dominante e violento, pois contempla apenas uma das forças de identidade, aquela que tem acesso ao poder.
A cultura é a síntese da moral e da ética de um povo. Moral é o consenso de práticas que fundamentam uma autorização de uma maneira de se comportar e ética é a capacidade reflexiva de se construir valores, elaborar o necessário para que o valor se realize, sendo essa realização parte da moral. Em suma, o valor é a tentativa da moral de colocar em prática a ideia da ética. Portanto, a Constituição é um pacto ético-moral que, muito mais que um documento jurídico, é a síntese de uma concepção ética de uma perspectiva moral de um grupo humano, é o pacto social, que busca replicar a concepção ética da ação moral justa, sendo este pacto o topo da hierarquia legal e a síntese da concepção ontológica, metafisica, material e espiritual do um povo.
f) Do etnocentrismo cultural ao etnocentrismo jurídico
O Etnocentrismo jurídico se caracteriza quando em determinado espaço, o sistema jurídico privilegia uma etnia em detrimento às demais, criando um sistema jurídico que não é justo, tendo em vista que rompe com o pacto social. Este pacto que nos assegura a equidade. Mas por qual motivo a equidade não chegou à coletividade brasileira? Porque, insistentemente, os atores que detém o poder conseguem criar estratégias que, a revelia do pacto constitucional, vão contra o povo, é a persistência do etnocentrismo cultural.
O desacoplamento entre a identidade um povo e a ordem jurídica acarreta o etnocentrismo jurídico, onde a ordem contempla de forma exclusiva apenas uma parte da cultura de um povo, que prepondera na forma de acesso à lei. Tal fato, pode criar um abismo entre o pacto social (a Constituição) e a realidade.
3. Antropologia na prática
As declarações dos atores políticos Neste tópico serão apresentadas frases e declarações, que estão a mão de qualquer verificação na internet, motivo pelo qual não colocarei a fonte, nem quem as proferiu, relembrando que todas foram proferidas por pessoas que hoje constituem o Governo Federal. O escopo destas declarações está limitado aos itens, não pela importância, mas pela necessidade de não alongar o presente ensaio, tendo em vista que há uma infinidade de declarações que seguem a mesma linha não só neste, mas em diversos outros assuntos, como questão da mulher, questão social, entre outras.
a. Sobre o Estado Laico:
"Brasil acima de tudo, Deus acima de todos."
“Deus acima de tudo. Não tem essa historinha de Estado laico não. O Estado é cristão e a minoria que for contra, que se mude. As minorias têm que se curvar para as maiorias.”
“Quero ajudar o Brasil e o mundo a se libertarem da ideologia globalista. Globalismo é a globalização econômica que passou a ser pilotada pelo marxismo cultural. Essencialmente é um sistema anti-humano e anti-cristão. A fé em Cristo significa lutar contra o globalismo, cujo objetivo último é romper a conexão entre Deus e o homem, tornado o homem escravo e Deus irrelevante. O projeto metapolítico significa, essencialmente, abrir-se para a presença de Deus na política e na história.”
“No Brasil, o mito está tocando a história e fazendo-a renascer. Esse toque é raríssimo e precioso. Apenas o mito empresta vitalidade à história. O marxismo, que quer encerrar a aventura humana (por saber que nessa aventura o homem acabará encontrando a Deus), odeia por isso o mito, e consequentemente planeja o fim da história.”
"Muitos tentam nos deixar de lado dizendo que o estado é laico. O estado é laico, mas nós somos cristãos. Ou para plagiar a minha querida Damares [Alves, ministra]: Nós somos terrivelmente cristãos. E esse espírito deve estar presente em todos os poderes. Por isso, o meu compromisso: poderei indicar dois ministros para o Supremo Tribunal Federal [STF]. Um deles será terrivelmente evangélico."
“Uma das principais mudanças conduzidas pelo governo Bolsonaro foi exatamente colocar a religião no processo de formulação de políticas no Brasil.”
b) Sobre os povos originários:
Embora tenha mais de quatro décadas, em 28/12/1976, iniciarei este tema com a frase proferida por Rangel Reis, Ministro do Interior, retirada do livro: O Genocídio do Negro no Brasil, de Abdias Nascimento - 1978.
“A 28 de dezembro de 1976, o altamente respeitado Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, publicou uma entrevista com o Ministro do Interior, Rangel Reis. Seu ministério preside os assuntos indígenas através da Fundação Nacional do Índio (Funai), e na entrevista Reis afirma: Vamos procurar cumprir as metas fixadas pelo Presidente Geisel para que, através de um trabalho concentrado entre vários Ministérios, daqui a 10 anos possamos reduzir para 20 mil os 220 mil índios existentes no Brasil, e daqui a 30 anos. todos eles estarem devidamente integrados na sociedade nacional.” “Embora, em agosto de 1994, tivesse voltado a pedir o fechamento do Congresso Nacional, declarando preferir “sobreviver no regime militar a morrer nesta democracia”, Bolsonaro concorreu à reeleição no pleito de 3 de outubro daquele ano. Sua plataforma de campanha incluía, além da luta pela melhoria salarial para os militares, o fim da estabilidade dos servidores, a defesa do controle de natalidade e a revisão da área dos índios ianomâmis, cuja extensão considerava absurda.”
“Ele devia ir comer um capim ali fora para manter as suas origens”
"É preciso entender que nossos nativos são seres humanos, exatamente como qualquer um de nós." Frase dita em 2019, quando o presidente discursava na Assembleia Geral da ONU.
"O índio é um ser humano igualzinho a nós. Quer o que nós queremos, e não podemos usar o índio, que ainda está em situação inferior a nós, para demarcar essa enormidade de terras, que no meu entender poderão ser, sim, de acordo com a determinação da ONU, novos países no futuro. Justifica, por exemplo, ter a reserva ianomâmi, duas vezes o tamanho do estado do Rio de Janeiro, para talvez, 9 mil índios? Não se justifica isso aí"
"Sobre o acordo de Paris, nos últimos 20 anos, eu sempre notei uma pressão externa – e que foi acolhida no Brasil – no tocante, por exemplo, a cada vez mais demarcar terra para índio, demarcar terra para reservas ambientais, entre outros acordos que no meu entender foram nocivos para o Brasil. Ninguém quer maltratar o índio. Agora, veja, na Bolívia temos um índio que é presidente. Por que no Brasil temos que mantê-los reclusos em reservas, como se fossem animais em zoológicos?"
"O índio mudou, tá evol... Cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós. Então, vamos fazer com que o índio se integre à sociedade e seja realmente dono da sua terra indígena, isso é o que a gente quer aqui".
“O índio não pode ficar dentro da sua terra como se fosse um ser humano pré-histórico, ele é igual a nós, estão querendo pedir para garimpar, plantar, arrendar terras, explorar o turismo"
“Temos uma certa herança da indolência, que vem da cultura indígena. Eu sou indígena, minha gente, meu pai era amazonense. E a malandragem. Edson (da) Rosa, nada contra, viu, mas a malandragem que é oriunda do africano. Esse é o nosso caldinho cultural.” “Meu neto é um cara bonito, viu ali? Branqueamento da raça.”
"Os povos indígenas têm hoje em torno de 13% do território nacional. A nossa área agricultável, e que é utilizada, é de 7%, segundo o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Se há política pública destinada a eles, por que continuam miseráveis com 13% do território nacional, quando nós utilizamos 7%? Essa terra não é de vocês; a terra é da União".
“Queremos legalizar garimpo”. Disse ainda que, “se o índio quer (garimpo), vamos atender interesse do índio.”
c) Sobre a questão dos negros:
“Eu fui num quilombo em Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gasto com eles.”
"Quem é que indica e nomeia o presidente do Banco do Brasil? Não sou eu? Não preciso falar mais nada então. A linha mudou. A massa quer o quê? Respeito à família. Ninguém quer perseguir minoria nenhuma. Não queremos que dinheiro público seja usado dessa maneira. Vocês sabem que essa não é a minha linha.”
“Quem usa cota, no meu entender, está assinando embaixo que é incompetente. Eu não entraria num avião pilotado por um cotista. Nem aceitaria ser operado por um médico cotista.”
“O racismo é coisa rara no Brasil ... O tempo todo tentam jogar o negro contra o branco, homo contra hétero ou pai contra filho. Desculpe o linguajar de um presidente da República, mas isso já ‘encheu o saco'”
"Negão é o Hélio, hein?! Meu irmão que demorou para nascer. Demorou 10 meses para nascer. O Hélio deu uma queimadinha. Deu uma queimadinha no Hélio aí, senão seria minha cara"
“O Dia da Consciência Negra "celebra" a escravização de mentes negras pela esquerda. Precisa ser abolido!”
“No Brasil de hoje Zumbi seria um bandido ou defensor de bandido, integrante do MST.”
“Cotas para negros precisam acabar! Além de estimular a fraude racial, ignoram o mérito, desrespeitam o princípio da igualdade, geram ressentimento e alimentam o racismo.”
“... um jeito masculino que vem desde Monteiro Lobato, que chamava o brasileiro de preguiçoso e que dizia que lugar de negro é na cozinha.”
d) Sobre orientação sexual e identidade de genêro:
“O Brasil não pode ser um País do mundo gay, de turismo gay. Temos famílias.” “Menino veste azul e menina veste rosa.”
“O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um couro, ele muda o comportamento dele. Tá certo?”
“90% desses meninos adotados [por um casal gay] vão ser homossexuais e vão ser garotos de programa com toda certeza”
“Não existe homofobia no Brasil. A maioria dos que morrem, 90% dos homossexuais que morrem, morre em locais de consumo de drogas, em local de prostituição, ou executado pelo próprio parceiro.”
“O cara vem pedir dinheiro para mim para ajudar os aidéticos. A maioria é por compartilhamento de seringa ou homossexualismo. Não vou ajudar porra nenhuma! Vou ajudar o garoto que é decente.”
“Se você diz que só é preciso amor para ser uma família, você vai dizer que eu e meu cachorro somos uma família.”
"Quando conheci o Bolsonaro pessoalmente, encontrei um cara doce, um homem dos anos 1950, como meu pai, e que faz brincadeiras homofóbicas, mas é da boca pra fora,..”
“Uma parte do eleitorado se simpatizou comigo na pré-campanha e na campanha tendo em vista a educação. Eu não vi discussão sobre ideologia de gênero. Isso, no meu entender, não é mais para ser discutido lá. O pai quer que o filho seja homem, que a filha seja mulher. Coisa óbvia, né? Que respeite a cultura dos pais.”
e) Sobre orientação política:
“O erro da ditadura foi torturar e não matar.”
“No período da ditadura, deviam ter fuzilado uns 30 mil corrutos, a começar pelo presidente Fernando Henrique, o que seria um grande ganho para a Nação”
“Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”
“Não se assustem então se alguém pedir o AI-5.”
“Vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre. Vou botar esses picaretas para correr do Acre. Já que gosta tanto da Venezuela, essa turma tem que ir para lá.”
“Marielle não era negra, ela era parda (mulata), mas autodeclarava-se negra por conveniência política, para reforçar o perfil de "vítima" e "oprimida", o que nunca foi. A vereadora assassinada do PSOL é um eloquente exemplo do que os negros, e por extensão os brasileiros, não devem ser.”
“É inacreditável que tenham tentado ligar nosso presidente ao assassinato dessa mulher sem valor. É preciso que Marielle morra, só assim ela deixará de encher o saco!.”
“Pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada através de um plebiscito, como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada, pois é uma guerra simétrica”
"Onde você viu no mundo uma ditadura entregar para a oposição de forma pacífica o governo? Só no Brasil, então não houve ditadura... Nunca tivemos, nas Forças Armadas, uma política de estado repressiva dessa forma que tentam o tempo todo botar na nossa conta. (...) Eu não quero dizer que foi uma maravilha, regime nenhum [é uma maravilha]. De vez em quando tem um probleminha""
“Eu sou, realmente, a Constituição.”
f) Sobre fomento, proteção e difusão da Arte:
“A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional, será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional, e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes do nosso povo – ou então não será nada.”
“Projetos com rappers serão aceitos na Fundação Palmares somente após rigorosa checagem da vida pregressa dos "artistas". Aqueles que enveredam pelo caminho do crime, da apologia das drogas e da putaria, ou se deixam usar como capachos da esquerda, jamais serão contemplados!”
"Fomos garimpar na Ancine, filmes que estavam já prontos para ser captado recursos no mercado. [...] É um dinheiro jogado fora. Não tem cabimento fazer um filme com esse tema."
“Obviamente que, fazendo bons filmes, não vamos precisar de cota mais. Há quanto tempo a gente não faz um bom filme, não é? Vamos fazer filmes da história do Brasil, da nossa cultura e arte, que interessa a população como um todo e não às minorias.”
“Os filmes que estamos fazendo a partir de agora não vão ter mais a questão de ideologia, aquelas mentiras todas de histórias passadas, falando do período de 1964 a 1985. É sempre fazendo a cabeça da população como se esse pessoal da esquerda foi o mais puro, ético e moral do mundo. E o resto como se fosse o resto.”
4. As consequências concretas das declarações dos atores políticos: As ações governamentais
Neste tópico, apresento uma amostra das ações governamentais que são a face concreta das declarações dos atores políticos, a transformação das frases e ideias em ações, que assim como as declarações não se esgotam por aqui, pelo reduzido espaço do ensaio, e nem por hoje, já que muitas ações oriundas dessas ideias serão, muito provavelmente, ainda implementadas.
a. Sobre o Estado Laico:
O Estado Laico é um conceito do secularismo onde o poder do Estado é oficialmente imparcial em relação às questões religiosas, não se apoiando ou se opondo a qualquer religião. Atualmente, observamos de forma cotidiana diversos ataques ao Estado Laico em discursos oficiais, nomeações políticas condicionadas à religião de matriz cristã e políticas públicas contaminadas por ideias cristãs. Bastando observar a religião dos ministros, por exemplo, muitos sem qualquer capacidade para a coisa pública, indicados de forma obscura como a Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (https://veja.abril.com.br/brasil/damares-deve-lancar-campanha-de-abstinencia-sexual-em-fevereiro/), do atual Ministro da Justiça, um pastor que se diz um servo e chama o presidente de profeta
(https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/04/28/novo-titular-da-justica-e-pastor-e-tem-interlocucao-com-ministrosdo-stf.ghtml) e do atual Chanceler que deixa claro sua posição religiosa que influencia na política externa brasileira . Assim, observa-se ações com cunho religioso como defesa das Igrejas Evangélicas, inclusive com interferência pessoal do presidente junto à Receita Federal para perdão de dívidas (https://exame.abril.com.br/brasil/bolsonaro-manda-receita-perdoar-dividasmilionarias-de-igrejas-evangelicas/)., bem como participação política em diversos encontros
religiosos evangélicos (https://oglobo.globo.com/brasil/coordenador-de-indios-isolados-da-funai-omite-atuacao-em-projeto-missionario-de-evangelizacao-24385866). O Itamaraty tem contrariado a Constituição e pregado a religião como política de Estado. Com seu apoio, parlamentares ligados a igrejas neopentecostais estão ocupando espaços para liderar a agenda do Brasil junto aos países africanos. A iniciativa pretende facilitar a entrada de igrejas e missionários nessas nações. O governo tem dado apoio a missionários para evangelizar indígenas (https://istoe.com.br/afronta-ao-estado-laico/).
b) Sobre os povos originários:
Em relação aos povos autóctones, se observa, conforme citado no tópico 3, uma retomada da política integracionista da Ditadura Militar (https://istoe.com.br/massacrede-indios-pela-ditadura-militar/), buscando uma contínua aculturação, genocídio e extermínio de toda uma cultura. O projeto fica claro no aumento absurdo de desmatamento das florestas (https://g1.globo.com/natureza/noticia/2020/04/13/alertas-de-desmatamento-na-amazonia-crescem-5145percent-noprimeiro-trimestre-mostram-dados-do-inpe.ghtml), na falta de apoio da fiscalização e na punição explícita dos servidores do IBAMA que cumprem o seu papel (https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/04/30/interna-brasil,850174/chefes-do-ibama-queagiram-contra-garimpeiros-sao-exonerados-pelo-gove.shtml), bem como no constante incentivo a grilagem e garimpo em terras indígenas (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/02/bolsonaroassina-projeto-que-autoriza-garimpo-em-terras-indigenas.shtml) e descaso com os povos originários na FUNAI, fundação criada para ajudar a protegê-los, ainda mais visível na pandemia (https://observatorio3setor.org.br/noticias/desamparados-casos-de-covid-19-em-indigenas-crescem-733/ e
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/05/05/funai-diz-que-gestao-pt-era-socialista-e-criticapolitica-marxista.htm).
c) Sobre a questão dos negros:
Aqui continua a política de exclusão sobre a população negra, como se observa na questão quilombola (https://noticias.uol.com.br/colunas/rubens-valente/2020/03/28/governobolsonaro-alcantara-quilombolas.htm), cujas 800 famílias serão removidas após habitarem a mesma região desde o século XVII, para dar lugar a exploração de base militar em parceria com os Estados Unidos da América.
A ingerência da Fundação Palmares com um indicado que atenta contra todos os princípios e objetivos do órgão de proteção à cultura negra
(https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/12/01/Funda%C3%A7%C3%A3o-Palmares-a-nega%C3%A7%C3%A3o-doracismo-e-o-discurso-de-Bolsonaro).
A ausência de notas ou comemoração ao Dia da Consciência Negra também ajuda a mostrar o contexto no qual estamos inseridos (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/11/planalto-ignora-consciencia-negra-e-bolsonaro-se-nega-acomentar-destruicao-de-placa.shtml), bem como a constante embate contra a representatividade do negro no Brasil (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2019/04/26/diversidade-comercial-do-bbtem-mais-negros-do-que-media.htm).
A tentativa de embranquecimento do povo vem inclusive em propagandas governamentais (https://veja.abril.com.br/brasil/gabinete-de-braga-netto-criou-peca-polemica-apenas-comcriancas-brancas/).
Enquanto isso, assistimos ao genocídio do povo negro (https://jornal.usp.br/artigos/reflexoes-em-tempos-de-pandemia-necropolitica-e-genocidios/ e
https://brasil.elpais.com/brasil/2020-01-16/do-genocidio-negro-a-palmitagem-debate-sobre-racismo-se-multiplicae-enfrenta-contradicoes.html), mesmo após 40 anos da denúncia de Abdias Nascimento.
d) Sobre orientação sexual e identidade de genêro:
As ações governamentais sobre este tema seguem o ritmo das ideias. Observamos diversas tentativas de excluir as pessoas, em várias áreas de representatividade como na sáude (https://www.guiagaysaopaulo.com.br/noticias/saude/mandettainvisibilizou-lgbt-e-retrocedeu-em-politica-contra-hiv), na arte (https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2019/08/16/bolsonaro-diz-que-nao-vai-financiar-producoes-com-temas-lgbt-conheca-series-citadas.ghtml e https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2019/11/23/sob-risco-de-censura-e-ataques-de-bolsonarocinema-lgbt-amplia-vozes.htm), na questão da família não heteronormativa (https://observatoriog.bol.uol.com.br/noticias/2019/08/em-evento-bolsonaro-critica-familias-lgbt-e-diz-ideologiade-genero-e-coisa-do-capeta), no genocídio da população trans (http://especiais.correiobraziliense.com.br/brasil-lidera-ranking-mundial-de-assassinatos-de-transexuais), entre outras.
e) Sobre orientação política:
Neste aspecto se observa clara militarização do Governo, negação da Ditadura Militar, revisionismo histórico e perseguição de adversários políticos.
Se observa que este Governo tem mais militares em seus quadros que a própria ditadura (https://brasil.elpais.com/opiniao/2020-02-14/militarizacao-do-governo-bolsonaro-trincheirada-democracia-ou-pressagio-de-ditadura.html)
Além disso, observamos o tratamento dado a figuras como Ulstra (https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/08/08/bolsonaro-chama-coronel-ustra-de-heroi-nacional.ghtml) e Curió (https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/06/mpf-pede-investigacao-de-fabio-wajngarten-porpostagem-sobre-guerrilha-do-araguaia.ghtml), assassinos e torturadores confessos da Ditadura, tratados como heróis nacionais.
A negação da ditadura e o revisionismo histórico são visíveis (https://www.defesa.gov.br/noticias/54245-ordem-do-dia-alusiva-ao-31-de-marco-de-1964).
A perseguição política se dá em diversos meios, em exoneração de quem pensa diferente (https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2019/01/05/interna_politica,1019087/governobolsonaro-ja-exonerou-quase-4-mil-comissionados.shtml) e também por meio virtual (https://diplomatique.org.br/as-milicias-digitais-do-capitao/).
f) Sobre fomento, proteção e difusão da Arte:
Em relação a estes itens se observa a paralisa estatal e a falta de opção para a sociedade, observa-se que diversos editais culturais não saíram do papel e teatros como a Caixa Cultural de Brasília, por exemplo, praticamente pararam de apresentar peças, no contexto pré-pandemia.
Se observa uma política focada em retirar a representatividade das diversas formas de Arte, buscando um pensar único vindo do Planalto (https://artebrasileiros.com.br/cultura/para-juca-ferreira-governo-bolsonaro-decidiu-declarar-guerra-a-arte-e-acultura/).
A extinção do Ministério da Cultura e a sua subordinação ao Ministério do Turismo mostra o descaso (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/11/bolsonaro-extingue-cultura-eesportes-e-deixa-ministerios-de-mulheres-e-direitos-humanos-para-depois.shtml).
5. O que diz a Constituição de 1988, nosso pacto social
Uma lei só poderá ser boa e justa se atender aos interesses coletivos, aí sem será eficaz, caso contrário, representa uma violência. Para termos normas justas, não basta um código jurídico, precisamos do Direito para mediar os conflitos, que sempre irão existir, assegurando a liberdade e identificando a origem destes conflitos, compreendendo se este Direito representa ou não a identidade. Quanto mais representar a cultura no sentido coletivo, mais justo este sistema político será, diferente de uma perspectiva etnocêntrica, na qual o poder atende apenas uma visão do que seja justo.
Tendo isso em mente, apresento dispositivos constitucionais relacionados a garantir uma legislação e um país que atenda os interesses coletivos, lembrando que a nossa Constituição é diretiva, com cláusulas transformadoras, a Constituição cidadã, uma Constituição anti-etnocentrista, fundamentada em teses antropológicas:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos...: II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa V - o pluralismo político. ...”
“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária .... III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindose aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.”
“Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.”
“Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. § 1º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afrobrasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.”
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
Art. 216-A. O Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
6. Conclusão
A nossa Constituição busca, por excelência, a igualdade entre as pessoas, basta ler o seu teor. Entretanto, se a moral não for aberta, o Sistema jurídico não será fruto da coletividade e, assim, não replicará o estudo antropológico completo, tendo em vista que só podemos falar em sistema jurídico se houver uma ruptura com a moral fechada e evoluirmos rumo a uma moral aberta para enfrentarmos o desafio de equalizar as três matrizes que compõem a Cultura: a dos povos originários, a africana e a europeia, e dentro destas, diversas identidades e manifestações culturais. Um só povo para o Direito, mas com as identidades de fato preservadas, já que nenhum sistema legal pode ser contraditório com a sua Cultura, logo, as condutas normativas devem replicar as identidades e replicar a forma de pensar, ser e agir do seu povo.
Entretanto, fica evidente, que nosso cotidiano é marcado pela concentração de poder em uma minoria quantitativa, uma etnia branca hetero-normativa de origem europeia, que nos últimos 20 anos tenta com o imaginário coletivo alimentar o etnocentrismo, sendo contra, entres outras questões, a demarcação de terras indígenas e quilombolas, a política de afirmativa de cotas e o casamento LGBT, se apoiando em ideias oriundas de um regime totalitário e utilizando a religião como fundamento para a Política.
O presente ensaio que teve como objetivo, como dito anteriormente, de desnudar à luz da Antropologia Jurídica e da Constituição Federal, as intenções do atual governo, demonstra, claramente, que estamos de fato em um governo que fomenta a ideia ultrapassada de mito para preencher um vazio, além de professar o fundamentalismos religioso e as ideias de regimes totalitários, militarizados, agressivos e genocidas, que negam a existência do outro em várias dimensões, com o intuito de não permitir a existência de diversas Culturas, rompendo com o previsto no art. 215 da Constituição Federal.
Ficam diversas perguntas e reflexões:
Nosso país está sob a égide de um governo etnocêntrico?
Quantas Culturas podem caber em ideias e ações assim?
Quantas identidades de fato podem se representar?
Você se incomodou com o texto?
Quais as formas de resistir?
Gostaria que respondessem nos comentários do blog.
7. Bibliografia
CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 2 ed., editora Brasiliense, São Paulo
(2001).
EVERARDO, P. Guimarães Rocha. O que é etnocentrismo. 5ª ed., editora Brasiliense, São Paulo (1988).
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: uni conceito antropológico. 14ª ed., editora Zahar, Rio de Janeiro (2001).
SACCO, Rodolfo. Antropologia Jurídica, contribuição para uma macrohistória do Direito. Tradução de Carlo Alberto Dastoli, 1ª ed., editora WMF, São Paulo (2013).
Ninguém consegue ou tem coragem de responder um texto desses. Parabéns Ferret pela coragem de publicá-lo. Estamos sim sob a égide do pior que existe e não vai ser breve essa passagem. Uma massa acerebrada compra discursos rasos e segue como gado aqueles poucos psicopatas que estão bem conscientes do que fazem e o fazem por $ e poder e para ficarem impunes de seus crimes.
ResponderExcluirRodrigo,
Excluirgostaria primeiramente de parabenizá-lo pelo ensaio, em termos de conteúdo,o texto agrega demais aos que estão tendo contato com a antropologia jurídica, além de nos levar as reflexões profundas sobre o papel da universidade e dos professores em constituírem advogados para além dos escritórios e repartições públicas.
Sim, claramente vivemos um período de obscurantismo e claras investidas para a dominação de uma maioria elitizada sobre uma minoria marginalizada, a história não perdoará o presidente e sua claque pela falta de humanidade, respeito as instituições e sobretudo pela falta de apreço ao bem maior, a Democracia representativa. Não podemos jamais aceitar a concepção de uma visão unica de mundo e de cultura, não podemos aceitar que somente a elite fétida brasileira seja representada. Por fim acredito que a melhor forma de resistência é não normalizarmos as falas/ações deste governo, é essencial que nós como cidadãos razoáveis, esclarecidos estejamos sempre atentos a cadela do fascismo, afinal ela esta sempre no cio.