sábado, 12 de março de 2022

O Beijo no Asfalto – Coletivo Coletivo (Brasília/DF) – CCBB Brasília – Em cartaz até 27/03/2022 (Presencial)


    Teatro com lotação esgotada, um morto na ribalta, a voz de Nelson Rodrigues ecoando. Década de 60, 2022, e o que está por vir mostra que a essência humana, para o bem e para o mal, relatada na sua dramaturgia, permanece.


    Beijo no Asfalto conta a vida de uma pessoa comum, Arandir, um trabalhador, casado com Selminha há cerca de um ano, que entra em uma inevitável e fulminante espiral, após ter uma atitude nobre, de compaixão e misericórdia: atender o último desejo de um desconhecido moribundo, vítima de um atropelamento. 

    O espetáculo trata das consequências da realidade pós verdade, de como as versões de uma história podem ser nefastas, a hipocrisia da sociedade, as fakenews, que tanto destroem para sempre, ou por muito tempo, reputações, como podem elevar seres medíocres e oportunistas a lugares e posições que jamais mereciam estar.

 “Por que existem tantos olhos no mundo?” Nelson Rodrigues

    A montagem faz algumas atualizações e adaptações que funcionam muito bem, como a utilização de uma delegada para a personagem Cunha, a forma de atuação e figurino do repórter Amado Ribeiro, a troca da irmã mais nova de Selminha por um irmão gêmeo. Com certa intensidade, a peça se desenrola em uma crescente interessante até o final emocionante e surpreendente, com algumas atuações que se destacam, como as interpretações de Selminha, esposa de Arandir, seu irmão e seu pai Aprígio.

   “A dúvida é autora das insônias mais cruéis.” Nelson Rodrigues

    As soluções cênicas são bem construídas. Em que pese a utilização de cadeiras perfiladas para formar o cenário, que geram o risco de perda da dinâmica das cenas, algo que foi bem contornado pelas atuações e pela direção, compensado pelo efeito da tela dividindo o palco, criando um cenário às vezes paralelo e às vezes complementar ao principal, o que teve impacto muito positivo no desenrolar da apresentação. O fundo do cenário também acrescentou bastante, estampando o sensacionalismo que destrói e faz sangrar. O enterro ao fundo e o morto passando na frente do palco também ajudam a trazer o clima do autor.

    Por fim, o que fica da apresentação é uma montagem cuidadosa e bem dirigida por Fernando Guimarães, possibilitando ao público sentir e viver o universo do autor, embora tenha alguns pontos a melhorar, como a segurança de alguns atores nas cenas iniciais, algo que foi se diluindo ao longo da peça e deve se resolver no desenrolar da temporada. 

    Ficha técnica: clique aqui

    Fotos: Divulgação.


    Registro com pesar, neste texto, o falecimento de Isa Schmidt Bravo, 36 anos, promissora atriz do nosso teatro, muito talento, força e luz, dona de um sorriso cativante. Triste demais a sua partida tão precoce.



Um comentário:

  1. Mais uma uma boa crítica e dica de uma ótima atração para quem gosta de teatro.

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