Rivais!
A disputa e o conflito entre a comédia e a tragédia, personificadas em dois gênios do Teatro: Molière e Racine, seu ex-pupilo, na França do Rei Sol, Luís XIV. A vida e a obra de Molière contadas por seu ex-pupilo e agora rival, a vida de quem viveu o sonho de ser um homem de teatro até as últimas consequências, o homem que fez rir, desafiou mecenas, nobreza e clero; e permanece eternamente vivo nos palcos.
O espetáculo passeia na vida do grande dramaturgo, mostrando suas paixões, conflitos, apostas, acertos, erros, vitórias e decepções, risos e choros, apresentações e censuras, os dois lados de diversas moedas; as máscaras do Teatro. A plateia consegue saborear e viver cada segundo das 2 horas e 20 minutos de apresentação, que passam rápido demais, como se o tempo tivesse parado, para estar ali, na França do século XVII.
A peça traz interessantes reflexões pessoais e coletivas, sobre a importância da comédia, sobre a forma de mostrar o mundo e a sociedade em um palco, sobre qual o preço da não submissão da arte aos poderosos, sobre como estar alerta e forte para combater a censura e a estupidez. Fica evidente ao espectador, a força da obra, que tem muito cuidado estético, sonoro e no ofício do ator, um espetáculo de múltiplas camadas e de resultado incrível, daquelas peças que ficam na mente de quem ama Teatro.
Sob a precisa e intensa direção de Diego Fortes, as cenas funcionam como uma engrenagem, conectadas, sem espaços desnecessários. O palco o tempo todo em movimento, com diversas cenas acontecendo ao mesmo tempo. Há também o metatexto, o teatro dentro do teatro, como não poderia deixar de ser, por se tratar da vida de um gênio da nobre arte. As atuações são interessantíssimas, a de Matheus Nachtergaele é uma homenagem à Molière, sendo visível a forma generosa que ele divide o palco. Uma curiosidade: assim como Molière, Matheus, em entrevistas, declarou uma certa resistência ao fazer comédia no Teatro, e da mesma forma que o homenageado, se jogou no abismo no palco.
Além do protagonista, o público é presentado com as impecáveis atuações de Elcio Nogueira Seixas (Racine), Renato Borghi (Arcebispo Péréfixe), Josie Antello (Rei Sol), Carol Carreira (Armande), Rafael Camargo (La Fontaine), Luciana Borghi (Madeleine e Rainha Mãe), Jorge Hissa (Gonzago), Regina França (Mademoiselle Du Parc e Madame Parnelle) e Diogo Brandão (Baron e Primeiro Médico). O cenário e o figurino são bem detalhistas e trazem uma grandiosidade a peça. A trilha sonora, com músicas de Caetano Veloso, é executada ao vivo, por grandes músicos conduzidos pelo maestro Lully (Fábio Cardoso).
Uma peça indispensável, para quem viveu os últimos 4 anos em um país com a Democracia e a Cultura ameaçadas pelo mesmo tipo de políticos e religiosos, tanto hipócritas como corruptos, que perseguiram a Arte de Molière. Como é bom ver o nosso País e o nosso Teatro se reconstruir e voltar a florescer, trazendo mais leveza, permitindo o riso ao povo, em que pese a dureza do cotidiano, substituindo a dor pelo prazer de ter a chance de ser feliz.
A Arte sempre vence!
Ingressos: clique aqui
Agradecimento: Rodrigo Machado (Território Comunicação)
Fotos: divulgação
Meu Deus!
ou
Para Molière, com carinho
Se sua fé fosse uma utopia?
Se no lugar de templos suas esquinas tivessem teatros?
Se seu deus personificado fosse uma personagem?
Se seus dogmas fossem poesias?
Se sua prece fosse diálogo?
Se seus bancos fossem plateia?
Se seus profetas fossem dramaturgos?
Se seus pecados fossem parte do jogo cênico?
Se seus evangelhos fossem peças que nos mostram o caminho?
Se sua luz fosse holofotes?
Se seus sacerdotes fossem atores e atrizes?
Se a vida eterna terminasse sempre em aplausos?
Sejam bem-vindos ao nosso Reino
Rodrigo Ferret – 03/08/2020
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