sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Rinoceronte – Agrupação Teatral Amacaca (ATA) – Direção de Hugo Rodas – Espaço Cultural Renato Russo – DF


Li há alguns anos a peça “O Rinoceronte” de Eugène Ionesco (saiba mais), um dos pais do Teatro do Absurdo, que ele mesmo gostava de chamar de Teatro do Insólito. Escrita em 1956, a peça é um marco da dramaturgia com seu texto fluído, penetrante, alucinante, que contém humor ácido e muita reflexão filosófica a respeito da sociedade francesa à época. Um texto atemporal e cosmopolita, um clássico, que nunca deixará de ser atual nem universal.


Recebi com muita expectativa e felicidade a notícia de que o patrimônio vivo do teatro, Hugo Rodas (Biografia), iria dirigir este espetáculo apresentado pelo ATA, o resultado só poderia ser algo grandioso e mágico, como de fato é.


Somos recebidos por toda a trupe com músicas de Edith Piaf tocadas pelo trio formado por Gabi Correa (voz), Iano Fazio (contrabaixo) e Pedro Tupã (acordeom), que também participam da sonoplastia, toda realizada ao vivo. Músicas lindas, emocionantes, bem tocadas, cantadas pela voz incrível e hipnotizante de Gabi Correa.


A peça se passa em uma pacata cidade que de repente se vê aos poucos tomada por rinocerontes. Como em um efeito manada, numa onda, as pessoas começam a se transformar também nos paquidermes. Ionesco nos mostra a importância de resistir, de permanecer lúcido, de jamais se render, mesmo sabendo o alto preço a pagar por quem marcha em direção contrária à multidão, à manada. O preço de não se submeter, de não se conformar, de ser diferente. E assim, buscar a tão sonhada liberdade.


A adaptação do ATA é ousada e sensacional, sem dúvida uma das melhores montagens que já assisti. As interpretações justas e sincronizadas, sem defeitos ou vícios, com cada artista dando o melhor de si. O ritmo crescente, sem perder o fôlego nem a atenção do público, contagia. O clima burlesco representado. O figurino da peça bem cuidado e harmonioso. O cenário limpo, mas funcional e convidativo à imaginação. Destaque para o trabalho facial e corporal, trazendo insólitos e inesperados elementos de desenhos em quadrinhos para a peça, com exercícios de alta complexidade.


O elenco formado por Rosanna Viegas, André Araújo, Abaetê Queiroz, Dani Neri, Luiz Felipe Pereira, Camila Guerra, Iano Fazio, Juliana Drummond, Nobu Kahi e Gabi Correa, atua de uma forma impecável, resultado de um trabalho certamente duro, minucioso e detalhado aliado ao talento e experiência cênica de cada integrante. Haja força e garra.


Obrigado Hugo Rodas e ATA por presentear o público com Ionesco em uma montagem tão bem cuidada e bem feita. Encerro o texto com as palavras de Hugo Rodas (entrevista):


“Será que é uma sorte encerrar o ano com essa peça? Preferia fechar de outra maneira, dizendo outras coisas, tratando tudo isso de outra maneira e não tendo que me impor uma vez mais. É um trabalho muito forte e é muito forte o que estamos vivendo. Voltar uma vez mais há 40 anos e começar a lutar pelas mesmas coisas é muito estranho. É um passo tão forte, tão para trás. Ao mesmo tempo que é um orgulho também fechar o ano mostrando as coisas que precisam ser ditas"

Agradecimento: Max Lage (Espaço Cultural Renato Russo)

Ficha técnica: Clique aqui

Site do ATA: Clique aqui

Fotos: Diego Bressani

4 comentários:

  1. "O preço de não se submeter, de não se conformar, de ser diferente. E assim buscar a tão sonhada liberdade."
    Texto perfeito.

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  2. Vi a montagem ainda em sua estreia como disciplina na UnB, e foi uma experiência incrível. Rosana Viegas me fisgou ali com sua energia e presença. Adubo veio nessa mesma leva produtiva do Hugo naquela época. Tudo muito forte e esmerado. Fico grato a todos eles por experiências teatrais tão ricas! ��

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  3. Obrigado pelos comentários, sigamos resistindo à Era da Ignorância

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