Li há alguns anos a peça “O
Rinoceronte” de Eugène Ionesco (saiba mais),
um dos pais do Teatro do Absurdo, que ele mesmo gostava de chamar de Teatro do
Insólito. Escrita em 1956, a peça é um marco da dramaturgia com seu texto
fluído, penetrante, alucinante, que contém humor ácido e muita reflexão filosófica
a respeito da sociedade francesa à época. Um texto atemporal e cosmopolita, um clássico,
que nunca deixará de ser atual nem universal.
Recebi com muita expectativa e felicidade
a notícia de que o patrimônio vivo do teatro, Hugo Rodas (Biografia), iria dirigir este espetáculo apresentado pelo ATA, o resultado só poderia ser
algo grandioso e mágico, como de fato é.
Somos recebidos por toda a trupe com
músicas de Edith Piaf tocadas pelo trio formado por Gabi Correa (voz),
Iano Fazio (contrabaixo) e Pedro Tupã (acordeom), que também participam da sonoplastia,
toda realizada ao vivo. Músicas lindas, emocionantes, bem tocadas, cantadas
pela voz incrível e hipnotizante de Gabi Correa.
A peça se passa em uma pacata
cidade que de repente se vê aos poucos tomada por rinocerontes. Como em um
efeito manada, numa onda, as pessoas começam a se transformar também nos
paquidermes. Ionesco nos mostra a importância de resistir, de permanecer
lúcido, de jamais se render, mesmo sabendo o alto preço a pagar por quem marcha
em direção contrária à multidão, à manada. O preço de não se submeter, de não se conformar, de ser diferente. E assim, buscar a tão sonhada liberdade.
A adaptação do ATA é ousada e sensacional,
sem dúvida uma das melhores montagens que já assisti. As interpretações justas
e sincronizadas, sem defeitos ou vícios, com cada artista dando o melhor de si.
O ritmo crescente, sem perder o fôlego nem a atenção do público, contagia. O clima
burlesco representado. O figurino da peça bem cuidado e harmonioso. O cenário
limpo, mas funcional e convidativo à imaginação. Destaque para o trabalho
facial e corporal, trazendo insólitos e inesperados elementos de desenhos em quadrinhos
para a peça, com exercícios de alta complexidade.
O elenco formado por Rosanna
Viegas, André Araújo, Abaetê Queiroz, Dani Neri, Luiz Felipe Pereira, Camila
Guerra, Iano Fazio, Juliana Drummond, Nobu Kahi e Gabi Correa, atua de uma
forma impecável, resultado de um trabalho certamente duro, minucioso e detalhado
aliado ao talento e experiência cênica de cada integrante. Haja força e garra.
Obrigado Hugo Rodas e ATA por presentear
o público com Ionesco em uma montagem tão bem cuidada e bem feita. Encerro o
texto com as palavras de Hugo Rodas (entrevista):
“Será que é uma sorte encerrar o
ano com essa peça? Preferia fechar de outra maneira, dizendo outras coisas,
tratando tudo isso de outra maneira e não tendo que me impor uma vez mais. É um
trabalho muito forte e é muito forte o que estamos vivendo. Voltar uma vez mais
há 40 anos e começar a lutar pelas mesmas coisas é muito estranho. É um passo
tão forte, tão para trás. Ao mesmo tempo que é um orgulho também fechar o ano
mostrando as coisas que precisam ser ditas"
Site do ATA: Clique aqui
Fotos: Diego Bressani
"O preço de não se submeter, de não se conformar, de ser diferente. E assim buscar a tão sonhada liberdade."
ResponderExcluirTexto perfeito.
Hugo Rodas! Fantástico!
ResponderExcluirVi a montagem ainda em sua estreia como disciplina na UnB, e foi uma experiência incrível. Rosana Viegas me fisgou ali com sua energia e presença. Adubo veio nessa mesma leva produtiva do Hugo naquela época. Tudo muito forte e esmerado. Fico grato a todos eles por experiências teatrais tão ricas! ��
ResponderExcluirObrigado pelos comentários, sigamos resistindo à Era da Ignorância
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