domingo, 24 de novembro de 2019

Transmitologia - Maria Leo Araruna (DF) – Teatro Goldoni – DF



Multidão plural e diversa para assistir o espetáculo. Teatro mais que lotado. Cadeiras extras. Representatividade. Representranstividade. Como isso é importante!


Maria Leo Araruna nos esperando com arma em punho. Travesti. Apocalipse. Fim dos tempos. Guerrilha sem fim. Luta eterna de quem sobrevive contra a estupidez e a ocupação de espaço, de quem quer poder existir como é e não como a norma dita.


O espetáculo é construído em cenas com uma narrativa não contínua que remetem a preguiça de explicar a preconceituosos adeptos do burrismo que governa o país e/ou a religiosos cagadores de regras que ser travesti não é doença nem transtorno mental, que as pessoas devem ser respeitadas como são e que jamais deixarão de existir, de viver, serem felizes e buscarem seus sonhos.


A interpretação visceral, raivosa no bom sentido, com garra, vontade e emoção de Maria Léo nos conduz pela guerrilha em busca do espaço e da voz necessária à questão trans, saindo do limbo, do não lugar, destruindo paradigmas em busca de identidade, cidadania e direitos rumo à ruptura da normatividade que aprisona e assassina as pessoas.


A peça também rememora tragédias relacionadas à violência contra pessoas trans. Covardias contra Dandara (https://www.metropoles.com/brasil/travesti-e-torturada-e-morta-a-pedradas-em-fortaleza/amp), Verônica Bolina (https://homofobiamata.wordpress.com/quem-somos-3/repercussao-internacional/transfobia-de-estado/) entre outras, no país que mais mata transexuais (http://especiais.correiobraziliense.com.br/brasil-lidera-ranking-mundial-de-assassinatos-de-transexuais). Basta!!!

    
Destaque para a cena Manifesto Trav (Eco)-Ciborgue. Baseada em uma pesquisa sobre os textos Medéia, de Eurípedes e Manifesto Ciborgue, de Donna Haraway (http://ea.fflch.usp.br/obra/manifesto-ciborgue), a cena faz uma analogia fantástica entre a condição trans e o mito da criatura ciborgueana, um ser entre o orgânico e a tecnologia. Interessante a abordagem da questão da artificialidade dos nossos corpos, baseada na classificação em gêneros que se trata de nada mais que uma construção secular. Quem dita a norma? Quem faz as regras? Quem classifica? Quem determina o que é natural ou não? Por que um corpo cis é correto e um corpo trans não é? Essas diferenças não seriam essa a base da violência transfóbica? De vidas desnecessariamente perdidas, desperdiçadas.


Parabéns Maria Leo Araruna, Kika Sena e equipe. Que o eco do traveco ecoe. Como é belo ver espaços sendo ocupados e vozes ecoando, inclusive na Academia (UNB). Que essa luta traga novos tempos, com novas consciências, uma nova sociedade rompa desse apocalipse.


Ficha Técnica: clique aqui

Fotos:  Janine Moraes - @janinemoraees


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